A mulher e o jabuti (em uma noite quente de verão)
São aqueles dias quentes. A mulher não consegue mais dormir.
O calor a acordou com gotas de suor escorrendo pescoço abaixo e algumas delas
desciam pelas suas costas e usavam o caminho da coluna para chegar até seu
destino final, (aquele lugar que muita gente não gosta de pronunciar o nome).
Aquilo a deixou inquieta, pois sabia que não é saudável. Seu médico já havia
lhe dito uma vez que é perigoso e pode causar algum problema sério.
Afastou o pequeno pano que usava como lençol e abriu as
pernas com a intenção de que o pouco vento que vinha do velho e empoeirado
ventilador conseguisse apagar aquele fogo que se instalara em seu corpo. Nada
acontece. O calor continuava aquecendo cada vez mais seu corpo coberto apenas
por uma gasta e desbotada camisola. Ela decide então se virar na cama e alcançar
o interruptor do abajur que mantinha uma fraca e suave luz. Pronto! Agora
talvez melhore! Voltou-se para a posição anterior e deu de cara com um novo
cenário.
Era o céu. Estava ali, todo aberto, escancarado e oferecido
para ela. Ficou atônita, com tanta beleza e aquela imensidão de luzes piscando.
Como nunca pode ter percebido tudo aquilo antes? Sentiu seu corpo esquentar
mais, num quase pulo levantou-se e com um puxão afastou a fina e branca cortina
que ainda a separava daquela visão magnifica de uma noite calorenta com suores
descendo agora pernas abaixo.
Era uma noite de lua cheia, e ela, estava sentindo-se a
Madona Lunar. A mulher não entendia muito de fases da lua, mas dessa lua que
ali se mostrava no céu, ela sabia muito bem. Era uma lua redonda como se estive
grávida. Isso era preocupação dos mais antigos, nesses dias de lua cheia ou
grávida, como falavam, era a época de cuidados, pois os lobos estavam soltos e
alvoraçados e eles costumavam a virar homens maus e agarrarem jovens ainda
virgens e sedentas de paixão.
Mas, a mulher logo deixou de pensar nisso, pois ela não era
mais nenhuma jovenzinha virgem. Ficou a
admirar mais o céu e o calor explorando todo o seu corpo. Não mais aguentando
tanta quentura resolve banhar-se um pouco, olhou para os lados por fora da
janela e percebeu que o quintal estava totalmente iluminado com a luz do luar,
sendo possível aventura-se em um banho no banheiro, nos fundos da casa. Assim
fez, deixou jogada no chão a fina camisola e saiu porta a fora em busca de
refrescamento lunar. O banheiro era um pequeno quadrado e não tinha teto, sendo
possível ver tudo o que acontecia ao seu redor, melhor assim, pensou ela, em
uma fração de medo das histórias antigas. O chuveiro era feito de lata de leite
de onde saia gotas de águas refrescante. Isso que era importante. Ficou os
primeiros segundos se deliciando daquele frescor que percorria todo o seu corpo
deixando a sensação de brisa matinal, apesar de ainda ser de madrugada. A lua
estava lá revelando a hora e mostrando-se grávida e nua, sem vergonha ou medos.
Agora, a mulher já bebia da mesma fonte, fechou os olhos e
delirando de prazer daquele momento integrou-se a paisagem. Ao passar o gasto e
já sem cheiro sabonete por seu corpo sentiu que não estava mais só, sentiu um
frio na espinha. Pensou; seria um bicho do mato? Um coelho, um gato, uma cobra,
ou o danado do cachorro do vizinho que vivia implicando com o pobre de seu bom
e companheiro jabuti? Era um cachorro feio, grande e mal encarado, por sinal
nunca era visto com seu dono, e isso, fazia a vizinhança comentar, que um seria
o outro, tudo bobagem de gente que não diz coisa com coisa. Ou será que seria
seu vizinho? Não! Não podia ser ele, afinal, era um homem muito estranho, vivia
quase escondido, as más línguas falavam que ele era envergonhado por ser um
homem coberto por pelos e por isso tinha medo de se expor e ser repudiado, e
que nem seu cachorro com ele saia. Viu? Não diziam coisa com coisa. Era um
solitário. Ás vezes, ela o observava limpando o quintal, sempre com roupas que
cobriam todo o seu corpo. Ele sempre abaixava a cabeça quando percebia que a
mulher o observava.
Não! Não podia ser ele! E a sensação aumentou quando sentiu
que era real, pensou em gritar, mas sua boca logo foi tapada por uma grande e
peluda mão.
Sentiu falta de ar e uma leve tontura, mas não podia fazer
mais nada, estava dominada e seu corpo tremia de medo. Sentiu o peso do braço e
uns arfar em seus ouvidos, a respiração era quente e era sentida bem em seu
cangote, aquilo a deixou apavorada, mas quietou-se e deixou apenas seu coração
disparar. Era um misto de medo e prazer. Sim, prazer. Fosse o que fosse a estava
tocando com cuidados e desejos. A mão grande e peluda continuava tampando sua
boca e em suas costas sentiu algo como pelos grossos, ásperos a roçar em leves
movimentos foi quando sentiu que a outra mão tentava separar suas pernas. Deu
muito mais medo, mas sabia que mais nada podia fazer, e deixou o corpo mole,
foi quando sentiu algo quente escorrendo entre suas coxas, uma mistura de
calafrios quentes deixou seu corpo entorpecido e desmaiou. Quando voltou a si
estava em sua cama, olhou para a janela e através da cortina viu um céu já sem
luzes piscando, agora tinha uma leve palidez e a lua não mais estava ali.
Tentou virar-se para ajeitar o corpo confortavelmente, já que
o calor passara agora um sono débil chegava de mansinho, percebeu que estava
nua, e envolta de se o lençol da cama totalmente revirado e manchado de terra
molhada. Assustou-se, levantou-se de uma vez olhou para todos os lados e não
viu a caixa de seu jabuti que dormia sempre ao seu lado. De repente ouviu um
forte uivado, tremeu, sentiu medo, mesmo assim resolveu verificar através da
janela o que estava acontecendo no quintal. Num lampejo de visão viu o cachorro
do vizinho pulando a cerca do seu quintal e logo abaixo da cerca estava o seu
jabuti de pernas para o ar.
- Arre!- Desgraçado!- Enfim ele o pegou!
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