terça-feira, 14 de janeiro de 2014

Deixa-me sair


Deixa-me sair?
Não!
Não consigo mais respirar direito, o local é pequeno, escuro e abafado...
Deixa-me sair?
Não!
Já se passaram tanto tempo, bom, penso que já se passaram bastante tempo.
Aqui perdi a noção do tempo.
Deixa-me sair?
Não!
Disse que “penso”, mas acredito que não sejam mais pensamentos racionais, por isso não tenho com certeza a razão lógica do tempo e do penso. A razão lógica do pensamento, por exemplo, do porque vim parar aqui, a razão do abandono e da escuridão?
Deixa-me sair?
Não!
Às vezes, somente às vezes, não é sempre, pelos menos nos últimos tempos (que não sei mais quanto...) sinto frio, mas não é o frio que queima a pele, os ossos, é o frio que queima sim, dói, sufoca endurece a alma, o peito. Esse sim é o pior de todos os frios. Fico quieto, encolho-me diante da situação e com a cabeça entre as mãos para poder abafar um pouco o barulho do silêncio, sinto a sentença do amor.
Deixa-me sair?
Não!

Há pouco falei de “amor”. É amor mesmo?
Silêncio...
Responda é amor? Estou sentenciado por ter sido egoísta e ter uma forma diferente de amar.
Qual é a forma certa?
Silêncio...
Você que me julgou, condenou e sentenciou-me, diz; qual é a forma certa de se amar?
Silêncio...
Ainda estais aí?
O silêncio perdura...
Deixa-me sair?
O silêncio se rompe.
Eu... Eu... Eu preciso ir embora, outro dia volto...
Nãããooo! Fique! Por favor!
Silêncio...
Preciso tanto de companhia, sei que você não me quer como tal, então...
Deixa-me sair?
Silêncio...
Nesse instante o silêncio do ambiente de ambos os lados é rompido por um soluçar.
Não posso!( Sai uma voz embargada por soluços e gemer).
Não posso, não posso você é um monstro!
Dilacerou meu coração minha vida e a razão do meu viver.
Você acha que pra mim é fácil viver? Não!
 Aliás, não vivo, sobrevivo uma vida que restou de uma que você destruiu.
Odeio você! E um dia serei capaz de destrui-lo totalmente de dentro deste quarto. Você reclama da sua prisão, solidão, escuridão, mas já percebeu que não estar só?
Você acha mesmo que vejo o sol como outrora? Que sinto o vento do início e fim do dia como sentia antes? Que as estrelas ainda brilham para mim, como no tempo em que achava que tinha um amor fiel e que me amava? Você acha que ainda escuto o som do meu coração? Estamos surdos e mudos num mundo sem som, vagamos pelas noites escuras em busca de uma luz, uma brisa para arrancar a queimação de um corpo que arde como estivesse nas profundezas de um inferno dantesco, vagamos em uma floresta negra com sussurros horripilantes cheia de árvores de formas assustadoras que cobrem todo um céu sem chance nenhuma de ver um brilho pardo de uma estrela que seja no infinito da escuridão.
Soluços...
Silêncio...Você acha que sofre só? Que só você sente dor? Abandono?
E a dor de um peito que vive sem saber como sair de um quarto escuro no qual vive o monstro que ali lhe colocou e lá também ficou?
Agora sou eu que peço.  Deixa-me sair?
Silêncio...

Escrito e postado por Francisca Uchôa Souza
Desenho de Claudio Jr.